domingo, dezembro 30, 2007

Das nossas existências sobraram escombros de poesia e flores líricas; nossos eternos jardins.

sábado, dezembro 29, 2007


Desolado. Com as coisas da vida.

quinta-feira, dezembro 27, 2007

Assim vou, me sabotando, dia após dia...

domingo, dezembro 23, 2007

Gostaria de crer num deus qualquer, pra pedir que me levasse pra sempre...

sábado, dezembro 22, 2007

Detesto sábado de noite. Eu bem sei, 99% da humanidade ama e morre por um sabado noturno. Mas eu não sou a humanidade, ainda bem. É como disse "brilhantemente" quase num impulso num desses posts abaixo, que escrevo no calor e no frio do pensamento, sem revisar palavras e aposto no fato de que me dou autoridade suficiente para lidar com erros e acertos - falei que no sábado é quando eu DESISTO. É por aí ... admito que tudo que penso ou planejo ao longo da semana perde a razão de ser e estar no sábado a noite.

Tenho trabalhado com cinema, no atual momento dois roteiros pra dois curtas pra dois projetos diferentes, que não cabe explicar - detesto me publicitar. E hoje, agora, se bem que faz alguns dias, penso no quanto é DESCABIDO a atividade cinematográfica. Leve um leigo pra assistir por trás das cameras a execução de um filme, num estúdio ou externo e depois lhe pergunte o que achou - ele vai dizer o certo: odiou.

Estar dentro de uma produção seja como o diretor, ou ator, ou maquinista é as vezes pensar - que diabo vai dar essas cenas. Parece que nada ali dará num bom filme. Aí depois vem o montador assistindo as cenas brutas ao lado do diretor, e diz - isso dá um baita filme. Tudo porque na edição (montagem) acontece os milagres e finalmente a estória nasce.

Ao ver SANTIAGO, de João Moreira Salles, essa dúvida filosófica me pairou. Angustiado, quase desisti de tudo. Quase parei meus cursos de direção de Arte, direçao de cena, enfim, quase surtei e disse pra mim mesmo; isso não é arte é um ABSURDO. A relação do cinema com o teatro é também intrigadora. Pra Beckett provavelmente não teria diferença. Duvido ele seguir manuais de direção de cinema. Mas ele foi o HOMEM...

Em Santiago, do JMS, é preciso assistir - embora seja um filme sem apelo algum - é um Doc. irreal, uma ficção abstrata - um filme esquecido por 13 anos, refeito depois, que se configurou na explanação do filme sobre o filme - compliquei - pois é preciso ver. Isso se um dia alguém conseguir encontra-lo pra assistir, porque não é filme de ver em cinema, apenas em festival. Jean claude Bernadet explicou bem melhor que eu essa película instigante de Moreira Salles - que o próprio pensou mil vezes se devia ou não exibir.

O fato é que hoje tenho vontade de largar tudo. Não me anima pensar que o cinema é irreal e o que vale mesmo é a edição. Ainda assim, com toda mentira - Alex por Malcom MacDowell é meu vilão arruaceiro cyber punk preferido e senhor Kubrick é genial.

sexta-feira, dezembro 21, 2007

Dois anos de tormentos na paz extrema da razão - saudosos tempos turbolentos, sinto falta da ante-sala de Hades, do Inferno e os campos do Tártaro. Havia uma paz naquela tenebrosa situação, movimentos insanos, suor, calor, medo, alucinações desvairadas, mentiras, boatos, rumores, perseguições, blasfemias, deuses de madeira, sexo, amor, tesão, ódio, ciúmes, ira, sangue...

Saudades dos tempos da "não razão". Hoje vivo uma paz insuportável, um tormento na mente, um desassossego martelando o coração - maldita fantasma. Faz-me conviver com uma bala perdida alojada nos miolos.

É horrível...

segunda-feira, dezembro 17, 2007

Exausto desses tormentos, desses fantasmas. E exausto de ter de fingir uma vida inexistente.

quinta-feira, dezembro 13, 2007

Ensaios Históricos - Camille - o fim.



Passaram-se 30 anos, por Deus meu caro Renard. Estivemos tentando vê-la esses anos todos, contudo, apenas os gritos solitários nos alcançou. Realmente não entendo o abandono que a família Claudel impós a ela. Ainda se teme o peso da sociedade - é sempre isso, o sangue, o maldito nome herdado, que se preza mais que a vida. Deixaram-na entre paredes frias e mudas, ela conversando com sua sombra, sem trabalhar, sem viver.

Rodin é um pobre diabo que finge ser social, mas todos sabem que existe naquele maldito asilo - aprisionado um pesadelo, somente dele, que lhe rasga a alma, de remorsos doloridos. Eu bem sei, que ele evita passar diante do estúdio, onde ela superou o mestre e abriu portas para outras que virão ainda neste século.

E tudo que ela sempre quis foi deitar-se diante do muro frio de Rodin, jamais derrubá-lo. Ela amava aquele concreto, e não trouxe consigo exércitos para transpor. Ela simplesmente se ajoelhou, recostou sua cabeça na pedra gélida, mas ainda assim, foi abandonada. Ela se arrasou...

E arrasados somos pela covardia nazista devastando tudo, nossas defesas mentais já amargam uma derrota - qual sentido devemos tomar daqui por diante? Me lembro meu caro, da época da razão, atravessamos muitas décadas, pra chegar até a destruição em massa - ser feliz é indigno e ultrajante. E ser artista é uma infantilidade. Quem deseja ver Monalisa no Louvre - somente os nazzi, a mando do Diabo. Eles querem levar toda renascença e fazer uma nova Roma, esquecem que lá no asilo dos loucos - alguém grita em prantos todo o amor para as sombras. Não somos melhores por nossa Resistência em Paris, nas trincheiras pra resguardar nossas avenidas.

Enquanto as bombas caem - ela morre desconhecida e sem valor algum. A arte nesse presente momento é ineficaz e sua existência morreu, junto as milhares de cabeças que apodrecem nos campos europeus. E Camille precedeu esse capítulo já em 1906, quando surtou-se contra si mesma, ou seja, todas suas criações pagãs, suas estátuas, belíssimas, de curvas verdadeiras, muito mais que o calor e o arrepiar da pele. Ela destruiu tudo, porque pressentia isso. Não precisamos mais de galerias e museus, nem de quadros ou esculturas. Sobraram apenas escombros, estamos entre eles - Camille foi enterrada hoje amigo Renard 1943 - os alemães continuam bombardeando nossas cabeças, mas puseram-na numa vala bem funda, porque ninguém sabia quem era aquela franzina e decandente "jovem velha jovem". Abandonada pelo amor dos homens e do ventre.

Carta imaginária de Mallarmé para Jules Renard

Nota - Eu termino essa insolente tentativa ensaísta, com remorsos pessoais que se confudem com Camille e sua vida atribulada que hoje nos dá passagem para viver também o sofrimento. Infelizmente nossa contemporaneidade encontrou uma vazão para os infortúnios da alma, na alienação dos sentimentos. Antes era a razão que se opunha à existência plena da felicidade e da melancolia - agora é o consumismo do Carpe diem.

terça-feira, dezembro 11, 2007


Se um dia passares aqui, deixai teu perfume mais uma vez.

segunda-feira, dezembro 10, 2007

Ensaios - o porquê deles?

Perguntaram-me - porque parei de falar de mim pra falar de gente morta, famosa, do passado, enfim. Personagens reais, históricos, em fotos inusitadas (Simone nua é uma foto fantástica). Escolhi a dedo esses personagens reais do século XX porque todos dizem muito a meu respeito. A vida deles, dos pensamentos a personalidade se confunde comigo, ou então, posso admitir a influência de ambos numa auto-construção de existência.
Já sonhei antes encontrar uma Simone de Beuavoir e assim encontrei; e já a perdi também. Para não dizer de Beckett e Gerald Thomas, e o teatro do absurdo tão importante para meu imaginário. Beckett foi um divisor de águas pro teatro e pra mim. Sua desconstrução no pós-guerra, também foi minha própria desconstrução artística, especialmente na segunda "tentativa" que me propus de entender sua obra. Da primeira tentativa nos meus 20 anos de idade, não tinha maturidade pra compreender o que ele escrevia e poderia me nutrir. Sua escrita refletia o pensamento daquelas pensadores que perambulavam por uma Europa arrasada por guerras, escombros - hoje tenho total noção de escombros, entulhos e vazio.
No caso de Thomas, um amigo real, especial - sem falar da sua estética, do seu texto, produções, e de sua destemida inconformidade em relação ao mundo.
Kafka - minha vida tem sido kafkaniana nos dois últimos anos. E sua escrita impotente diante da desgraça humana, faz de um realismo, que pra qualquer leitor é natural. Kafka é absurdo, porque é realista. Sua relação com o pai ou a namorada "irreal" Felice, tem pontos importantes, passíveis de serem discutidos por muitos textos e ensaios, isso quer dizer - do quanto eu admiro personagens estranhos, complicados e atormentados pela vida.
Porque assim sempre fui, e tem sido. Dos dois últimos anos que se completam agora nesse início de verão, o que pra mim é um suplício nostálgico e o calor infernal, me faz confessar a estranheza que percorreu minha vida e "não vida". Reconheço-me e desconheço-me por completo. Sobraram as melancolias, e muitos fragmentos, de vida, de arte. Não aposto mais no amor, em sua verdade, não aposto em nada. Vivo dentre mundos - desmundus, e a literatura, o cinema, a arte são minha companhia.
Ainda tenho de escrever um último "ensaio" sobre Camile Claudel, mas é tão difícil descreve-la, mesmo pela ficção, porque me remete tantas sensações memoráveis. Ensaios, não são propriamente estudos ensaístas - sou escritor, mas não um crítico profissional. Foram brincadeiras e um pouco de confraternização com o passado e com meus fantasmas.

sábado, dezembro 08, 2007

Passei a detestar as madrugadas de sábado devido a nostalgia e a insignificância da atualidade, dos seres ao meu redor - despejo meu desinteresse nas sombras de minha reclusão. Não tenho vontades, nem desejos, por absolutamente nada. É no sábado meus planos naufragam e todos os sonhos concretos perdem o significado - construir uma casa, viajar para uma praia, escrever bons livros, editar um filme, ganhar dinheiro, ter um carro novo, salvar o mundo. É no sábado que desisto de tudo.

quinta-feira, dezembro 06, 2007

Ensaios Históricos - Kafka por Felice Bauer



Teus medos não foram os meus. Jamais entendi o temor que lhe afringia em relação a vida conjugal. Teus escritos denunciam uma amargura, um conformismo exato, nem mesmo a metamorfose pode derrubar as muralhas da letargia que li denunciadas em contos que escrevestes. E tuas cartas - sempre uma fuga da realidade para viver o inexistente solitariamente.

Talvez seja por isso, jamais, você nunca antes se atreveu a conceder e dar-me seu cotidiano. Kafka para mim já me foi um ser egoísta, outras vezes, um covarde. Mas isso, foram significados em momentos de raiva e desgostos, pequenos fragmentos derradeiros que nenhuma mulher pode controlar. Logo recuperei a serenidade para depois lhe entender.

Dessa sua necessidade de solidão, que levou teus personagens a jamais lutar contra qualquer situação equivocada, um realismo literário de pouca estima - deixa a impressão que o mundo é imutável - é portanto uma incoerência com seu principal título - A Metamorfose. Não precisou dizer-me que Gregor era seu alter ego em relação a seu pai e muitas vezes pude me ver na pele de outros personagens que criastes para se auto biografar em terceira pessoa, vazando assim sua personalidade atormentada.

Minha condição de mulher relutou contra muito disso. Passamos a vida, entre cartas, e não pude lhe conhecer na indócil presença da rotina. Não tivera eu, chance nenhuma, de viver entre paredes de um lar, assim, desculpe-me, você matou meus sonhos; coisas simplórias, pra tantos homens célebres, mas que para mulheres, mesmo as imponentes e intelectuais ainda se faz tão necessário. Elas até podem esconder, como fizera eu mesma, camuflar na pele do dia a dia, no lirismo da noite, mas todas desejam a sensação do bem estar de um lar doce lar.

Felice Bauer em carta ficcional à Kafka

terça-feira, novembro 27, 2007

É tão difícil ganhar um Nobel quanto produzir um curta metragem que não seja bandido e mocinho ou rico e pobre. No país dos desdentados escrever livros, roteiros, sobre moral, existência e introspectividade é falar grego e tupi pra brasileiros ianquis da sessão da tarde. Entendam isso como um desabafo resignado. Outra hora eu volto como um novo ensaio sobre Felice, namorada/noiva de Franz Kafka (dá pra imaginar) ?????

quinta-feira, novembro 22, 2007

Ensaios Históricos - Beckett e Thomas

1984. Aquele ali não é Beckett? Sim, o próprio Samuel Beckett, afinal ele mora aqui em Paris, o que eu esperava encontrar em Paris, Godot? Não, não, encontro Beckett. E aquele outro cabeludo conversando com ele, é do teatro também - Gerald Thomas, geniais. Ah, de que será que eles falam? Será que estão usando metáforas para xingar Miterrand ou a Dama de Ferro...nada disso - não perderiam tempo falando de "neo-liberais".

Eu queria ser uma mosca e passar por ali, mas pela postura becketiana me parece ser uma sabatina. Feito todas as vezes que me imaginei tomando um café na fazenda de Riobaldo conversando com Guimarães. Ah, não vamos misturar as biografias - são todos mestres. 1984, foi-me prudente essa viagem, mesmo sendo onírica. Esse ano tem cheiro de fim de partida (endgame Mr. Beckett - no dice).

Antes que partam vou tirar uma fotografia, sim, preciso reguardar isso pra daqui uns 20 anos escrever memórias de um desmemoriado.

Nota do Autor - Fotografia do arquivo de Gerald Thomas, baseado numas informações que o próprio me forneceu a respeito dessa proveitosa conversa com Beckett em Paris. Eu só rabisquei umas palavrinhas com pitadas de ficção intransitivas. Em 1984 eu tinha 4 anos. Obrigado Gerald...

quarta-feira, novembro 14, 2007

Ensaios Históricos - Simone de Beauvoir


Era 1950 na cidade de Chicago, Simone conhece Art Shay, por intermédio de seu amigo Nelson Algren. Art Shay fotografava personalidades que julgava serem interessantes. Por suas lentes passavam grandes e futuros nomes de biografias do século XX.
Shay convidou Simone para uma reunião com outros intelectuais da época numa casa que pertencia a um amigo do fotógrafo. Simone sequer conhecia o dono da casa, mas se encantou ao ver que numa das suites havia uma banheira. Ela logo quis experimentar.
Na sala, conversavam Sartre e outros homens que não me recordo quem eram - de fato senhores distintos, vestiam ternos bem cortados, pertenciam a burguesia americana e Sartre os olhava com indiferença, quem diria o comunista na toca dos lobos do novo mundo. Havia um homem vestindo uma camisa listrada e com suspensórios fumando um maldito charuto. Diziam ser um mafioso mecena.
Mas Simone havia subido ao seu aposento, dissera ao marido que iria descansar da viagem estafante, verdadeiramente deitou-se um pouco. Mas logo recobrou a consciência - havia uma banheira e ela estava muito empolgada com a idéia. Deita-se numa água morna para relaxar as tensões de uma época tão avassaladora.
Shay com faro de fotógrafo caminhava inquieto pelos corredores, abrindo portas, de quartos vazios da velha mansão. Parecia sentir o cheiro de uma nova fotografia prestes a nascer. Somente se ouvia o bater do sapato no açoalho de madeira e ruídos das fechaduras de bronze. Ele adentrou um dos quartos, na penumbra do fim de tarde, entre sombras ganhou o dia. Assim descreveu-me a cena - " ela havia tomado seu banho. Depois, enquanto ela se arrumava na pia, tive um súbito impulso. Ela sabia que eu a havia fotografado porque ouviu o clique da minha confiável câmera Leica Model F. - Homem travesso, disse ela."


Ensaios Históricos - Simone de Beauvoir Chicago 1950
(Fonte: site-www.simonebeauvoir.kit.net)
Nota do autor - Cansei de falar de mim, então, essa série "ensaios" aborda personagens reais em episódios verdadeiros com pitadas de ficção, sempre através de um registro fotográfico, quando possível. É a primeira vez que faço tal coisa e iniciei com a grande escritora Simone de Beauvoir, fotografada por Art Shay - ela uma das primeiras feministas filósofas existencialistas da primeira metade do século XX. Espero que aos fantasmas, apreciem ou não. Au revoir a tout le monde.

Qual o sabor da derrota?

A normalidade não me cai bem...travo, travo batalhas contra ela. Pra mim é difícil me comercializar e fazer apenas a simplicidade mundana. E quando então ouço o mugir do FRACASSOOOO...

sábado, novembro 10, 2007

Uma idéia na cabeça, uma arma na mão




Por mais mil bocas que eu beije ou mil mulheres que conquiste, nada e ninguém me faz aliviar o vazio da alma. Como se numa experiência subjetiva - mergulhei dentro de um abismo sem fundo, continuo a cair para dentro de mim vagarosamente. Eu olho pra cima, tento me estabelecer numa plataforma de vida cotidiana, eventualmente com êxito, mas não demoro a perceber - é inútil, não funciona de verdade, é somente uma impressão. Eu volto pro meu caminho não mais pensando, já ultrapassei essa questão. Agoras os pensamentos estão dentro dos pensamentos, difícil explicar. Será que ela suportaria tudo isso, como assim tenho feito, não creio. Então tenho certeza que a escolha feita por mim foi correta. Eu tenho suportado, sabe-se lá como, mas ainda não apertei o gatilho.

sexta-feira, novembro 09, 2007

Senhora implacável me persegue.

Hoje acordei stalinista - o mundo não precisa ser salvo pra essa ralé humana.

quarta-feira, novembro 07, 2007



Há quem tenha duas caras. Tenho eu umas três ou quatro ao mesmo tempo. Desde quando inseri um nariz dos Incas que ficou muito bem simétrico ao meu nariz mouro permanente, dando-me um aspecto robusto e excêntrico. E quando me observam com tamanha insensatez, lhes falo - são vítimas da ignorância e do excesso de prudência - TOLOS. Eu que não me canso, de retalhar-me feito estilhaço. Gosto mesmo é de pedaços de mim, todos vivos e mortos. Sou todo assim destruído, trechos ou fragmentos imperfeitos, feio mesmo, se preferir.
E se lhes parecem um tanto bizarro, ter duas bocas, saiba que no Bacanal do Fim do Mundo terei duas línguas para falar e lamber feridas e vulvas é claro, de anjas com seios triplos e siliconados que descerão dos céus pra me agraciar. E que tolos como vós serão condenados à insignificância até logo desaparecer.
(arte e texto por Mau Fonseca 2007)

quinta-feira, novembro 01, 2007

Bacanal do fim do mundo


"Reza" lendas do lá Bem pra de lá que no fim do mundo São Picasso irá nos desenhar com feições cubistas e todos teremos cara de [Cu]bismo. Faço caras e bocas, já dizia Tia Ziza caolha - mas meu relato, meu resmungo veredito é sobre o julgamento final. Quero ter duas bocas, uma pra mentir e a outra pra mentir mais ainda. Mas quero bocas diferentes, porque sou todo assim Assimétrico e me orgulho disso.
Quero ter uma pinta na testa, e noutra testa duas sombrancelhas. Sentiu o estilo, pois não sinta, guarde tudo pro bacanal do fim do mundo, donde homens terão quatro línguas pra ouriçar mulheres com duas vulvas, ah que loucura, e teremos dragões fêmeas de pernas abertas soltando fogo pelo sexo. E vai chover na terra 100 dias 100 noites 100 tardes 100 madrugadas, sem parar. Quando então, meu caro amigo e amiga, todos os pecados serão lavados com água corrente.
(Ilustrações neo cubistas parafraseadas por minicontros - Arte e texto por Mau)

domingo, outubro 28, 2007




















Mamãe disse que sou linda, linda de matar e de morrer. Semana passada comprei um novo par de olhos e implantei em mim. Agora posso ver através de um, dois, três, quatro olhos diferentes.
Isso combinou com minha dupla personalidade, verde amarelada, ora estou de perfil, ora 3x4, ora olho pros meus lados, ora pro céu ou para trás, não importa. Sou ou não sou linda?

sábado, outubro 27, 2007

Resmungos

Saudade da inocência?
se for pra resmungar que faça
algo inovador
falar do tempo da inocência
qualquer poeta já o poetizou,
é normal que com tempo,
e tempo se vai a Era do ímpeto,
do amor fácil, da crença
e do entusiasmo
isso é o natural, é da vida,
já vistes algum idoso
olhar a Lua ou o pôr-do-sol
com esperança - nem responda,
é tudo pergunta retórica,
eu me canso dessa ciranda,
estou desde criança cir[andando]
que doi, que tonteia
a alma.

sexta-feira, outubro 19, 2007

Harakiri


Jamais tive época tão "braba" como estes anos últimos. Época em que pensei mais sobre suicídio, harakiri, enfim, estou de um cansaço mental, emocional com esse mundo e comigo, uma fadiga imensurável. Não quero mais fazer e nem acontecer. Estaria pra lançar um livro - que belo, que lindo e exuberante, lançar um livro, ser um intelectual, posar de inteligente e satisfeito - gente feliz e revolucionário. Não e não, abortei a idéia, meu livro está aqui impresso em páginas recicladas do modo "rascunho" do MICROSOFT WORD, grifado com caneta marca texto, as palavras que já deveria ter substituído por sinônimos indecifráveis, que eu julgo ninguém entender - e que eu realmente gosto e aprecio - de escrever pra ninguém compreender e manter meu "ar" tão enigmático.

Como disse estou cansado do mundo e de mim. Cansado das pessoas, das mulheres, como descrito abaixo, cansado de mim e desses "nuances" emblemáticos que me compus durante os anos. Cansado do meu humor duvidoso, das minhas poesias "geniais" e banais, cansado do meu ar de desprezo pela vida e da vida em desprezo pela razão. Cansado da mesmice e de todos que fazem o jogo, cansado de jogar contra a mesmice e ser dela um filho rebelde.

Cansado de ser, de Ser, e não ser, nada, além de uma matéria idiota. E antes que esse texto esteja com jeitão intelecutalizado, resmunguento, devo parar e dizer. Ando pensando tanto, mais tanto em largar tudo e me alojar num templo budista. Tem um em Cotia, lindíssimo, gigante e com belos jardins. Mas minha cabeça não para de pensar, de atormentar-se, e lembrarei que não concordo com muitos dos preceitos budistas. Estaria então mentindo pra mim mesmo ou apenas com segundas intenções, para ter um teto para morar no meu futuro arruinado.


“II y a toujours quelque choed’abient qui me tourmente”

C. Claudel


quarta-feira, outubro 17, 2007

Casanova no século XXI (coitado)

E se Casanova, símbolo da conquista intelectual do século XVIII resurgisse em pleno 2007, dentro desse nosso século??????? Será que ele teria o mesmo ímpeto de sua vida contada em livros e romances, que o próprio escrevera, já que além de conquistador de mulheres era excelente escritor (em pleno Iluminismo) além de diplomata.

Em se comparando os mundos que separam, uns 300 anos, creio que senhor Casanova teria um grande desencanto. Talvez pela própria evolução humana, mas principalmente pelos rumos que as mulheres trilharam. Elas se tornaram tão banais quanto os homens. Elas que sempre tiveram maior sensibilidade e percepção, sofisticação, e foram a ponta do iceberg, quem sabe, a esperança - sucumbiram.

Hoje, não mais, se deixaram enredar pela banalidade e insensibilidade. A revolução sexual que foi conquista, também foi o túmulo feminino. Não há mais nada de especial, não há intelectualidade (o que é incoerente porque são elas que estudam mais), prova que se graduar não significa necessariamente ter conhecimento. Não há sensualidade, porque optam pela mesmice do Ser, pelo emburrecimento, pela soberba modernética, pela imbecilidade dos atos, pelo comum. O bom é ser diferente, é ser incomum (isso já virou clichê pop no orkut)

Antes as mulheres eram subjulgadas, isso no tempo da guilhotina, mas se refugiavam no conhecimento de livros, das poesias, do lirismo, eram as musas de poetas, quando também escondidas no "gineceu" escreviam suas poesias, contos, romances, tocavam flauta, piano, balet, enfim.

Hoje poeta morre de fome, porque não há musas, nem sereias. O mundo está mais pra uma confraria das Bruxas.

sexta-feira, outubro 12, 2007

Resmungos (passado e presente)

"Das Esperas
Um vento que beija a mão
A violeta que perfuma o ego
pinta e borra nublando a alma
Nada vai mudar...Os sapatos continuam no mesmo lugar
Silêncio dos passos únicos
Incertezas dos gestos
Eternos indos e vindos "

"ele sabe do meu alfabeto,
esse mesmo que não existe,
enquanto invento verbos e estados pra ser.
Eu curiosa enquanto convenciono :. o amo." [fragmentos dela]

Em resposta à minha amada poupeé do oriente

Saudades de tua insônia
culta e bela
me enchia de sonhos líricos
Saudades de tua insônia
insegura e frágil
que se perdia em meus braços





Estive lá, pelas escadas rolantes, até o terceiro andar, andarilhei em volta das mesas, passado e presente no mesmo eixo, da mesma plataforma da vida; foi dum solavanco no peito, atiçou meus neurônios mortos ou preguiçosos, mãos e pés transpiravam, foi como tornar o mundo cinza e branco, daltônico, estavam até meio paralisados. Só havia dois vivos ali, uma dupla, sob um palco improvisado, tocando algo instrumental, no teclado e na guitarra - uma bossa nova tão velha quanto meus sonhos desajeitados e insípidos.

Já não tenho ânsia pela vida plena, sinto tua falta, tua insônia culta, divagadora, ameaçadora, tu deixastes em mim tua sementinha, tão inocente, foi-se viver a vida alegre, abstraindo imagens nossas, parou até de poetizar o amor, fechou-te os olhos cintilantes, agora és rainha do lar doutro alguém distante, mas tua obra não ficou ao esmo dos ventos que nos enchem o canto dos olhos de areinha fina, lacrimejando nossas faces, esfumaçando a maquiagem das moças que se enfeitam em fim de tarde para sair e bailar.

Não meu caso, meu jeito, eu não me cuido, sem pouco algum esmero por mim, escrevo essas parcas e abutres palavras sem esperar que leias, eu bem sei, trocamos de vida, tu fostes ter o Viver e eu o Morrer.

Sou a decepção dos deuses, porque não quero viver, isso pra um Deus é um enorme desgosto. Em todo canto, clamam, gritam, choram, prantos de dor e esperança, por mais vida. Mais tempo, mais coisas, curvas, retas, subidas e decidas. Eles não se cansam - cansam nunquinha mesmo? Eu estou tão exausto, que os pensamentos entraram em greve, deixando apenas os emergenciais de plantão. Um deus não pode aceitar, que o súdito de sua divindade escolha não viver. Isso lhe cabe divinamente decidir, mas eu sempre estou pela beirada da normalidade, não é mesmo, do avesso, e decido por mim, por nós, como fiz, feito, fizera, está tudo aí, você poderia me agradecer, com um verso, pelo bem que te deixei conhecer.

A vingança dos deuses é me dar muita vida. Saúde plena, intacta, surreal, a juventude, a pele lisa, caramelizada, com o bâlsamo excêntrico do Universo, deixando a senhora gélida Morte bem distante de meus olhos, meu reino, meu lar, meu céu e mar. E o castigo ainda vem com mais força, porque mantém minha mente em vã possibilidade, infinitamente funcionando, lembro de tudo, de você é claro, consciência a varrer desertos, o castigo é lembrar por demais, é ter a Razão, a emoção, e olhar pro meu redor e nada sentir, não há palavras a descrevê-los, nada excita ou emerge com vontade; é só um desânimo que dá, machuca, ninguém parece bem ou bom, bastante, para tirar-me disso, não há charme, cumplicidade, sintonia, o vento não me leva, não deixo levar, não há querer, não quero, não vou, vou? Não.

Então eu suspiro com o vento contra minha boca.

E eu me arrependo.

Me envergonho de mim.

terça-feira, outubro 09, 2007

Estou cansado demais, exausto. Meu corpo já não sabe se entristecer e muito menos se alegrar. Não quero e sequer tenho ânimo para escrever estórias, contos, ou pintar quadros. Muito menos filmar roteiros. A arte pra mim já estava morta, antes mesmo de me tornar ou pensar ser Artista Profissional, diplomado em Universidade (pra quem ninguém me dissesse - artista de gaveta). Estou híbrido, nem triste, nem nada, não sinto nada. Sem tarja preta, rindo de coisa alguma, sorriso bobo estampado na cara. E ao mesmo tempo, tenho consciência da imbecilidade. Parece que já ouvi essa coisa toda sair da boca de alguém. Um alguém perdido no passado. Ah, que saudades de sua letargia brilhante. Hoje eu vivo a "pós-estória" ou a "entre-vidas". Faz muitos dias, mais de mil sóis, não (re)começei absolutamente nada. Estou pairado no tempo, como o beija-flor que vi aos 14 anos de idade no quintal. Aquele mesmo, eu já sabia, ele me retornaria.

A vida me decepciona profundamente.

domingo, outubro 07, 2007

Resmungos


(Ilustração sobre a poesia abaixo)

sexta-feira, outubro 05, 2007

Resmungos

Meus dias são bons pra se morrer
o ar é frio
a paisagem daltônica
as mãos transpiram
o sangue paralisa
as vozes se (re)criam
o céu se envergonha
o coração (é só um músculo)
a boca resseca
os significados esvaziam
a lua, é só o que parece ser
o concreto duela com abstrato
as poesias; inúteis
os ditados faliram-se
provérbios, todos esquecidos
a fome, cala-se
a boca não enxerga mais
os olhos me comem
ouvidos, cabelos, nariz, estão ali e lá
sonhos, eu durmo
noite, acordo
insônia, eu bocejo
na cama, me revigoro
no chuveiro, choro de mentirinha
no vento, expiro
e no contar dos minutos
desisto.

[todo dia é dia de morrer-me]

segunda-feira, outubro 01, 2007

Abismo final

"Me pergunto", quando foi que decidi entrar para a estrada do conhecimento, e cavei minha própria desgraça. Se eu fosse ou me mantivesse na ignorância, estaria hoje aí como todos, rindo da desgraça, fazendo filhos e me mantendo vivo, pra cuidar dos filhos. É assim que a classe pobre e operária sobrevive. Tem-se filhos, pra cuidar, e viver até aposentar, e os filhos, cuidarão dos pais, ou mandarão pros asilos, não importa, quem cria filho, não tem tempo pra crise, nem existencial, nem metafísica, muito menos tempo pra ler e filosofar, pra saber das últimas da antropologia, do Niilismo, do sartrismo ou tentativas de decifrar Guimarães Rosa (ohh homi difícil). E pensar em se matar, isso nunca, a vida é pra ser vivida, parece que escuto um caboclo falar atrás de mim.
Ficar ouvindo sua própria voz, ressonando passado, vidas paralelas, poesias transcendentais, é coisa pra quem não vive a vida. Enfim, eu passo dias a ler e ler, como disse decifrar enigmas de autores enigmáticos. E passo a escrever, mesmo não me reconhecendo, não funciona mais alter-egos, por isso eu os matei, enterrei, e sequer derramei uma lágrima. E ando por aí, e não vejo esperança - alguém ainda me manda ir pra Igreja - odeio, seja católica e principalmente evangélica.
Lembro então de Haroldo de Campos - um homem dedicado ao conhecimento. Mentor do Concretismo, tradutor de muitas línguas complexas, de obras da literatura mundial, como James Joyce, Homero, sei lá quem mais, escritor, dramaturgo, crítico. Morava numa casinha pequena e simples, em Perdizes, São Paulo, dentre condomínios de classe média baixa, de ignorantes. Ninguém sabia, ou gostaria de saber, que aquele senhor de barba longa e branca, era ali na vizinhança, um dos mais cultos homens do século XX. Morreu, ninguém soube, duvido que não o confundiram com papai noel. Odeio Natal, esse velho idiota, e datas sazonais.
Estou exausto. Malditos fantasmas.

sexta-feira, setembro 28, 2007

Um pequeno Conto e um recado

Era 1964, estação do trem Itapevi. Andava com minha mãe. O trem do meio sempre trazia a boiada. A manhã fria esfumaçava uma neblina gélida. Estava com aquela blusinha pobre de lã, um cachicol feito por minha mãe, que não era prendada coisa alguma - odiava afazeres do lar, era mesmo boa cabeleleira. De repente, as 7:45 escaparam. Vacas e bois soltos pelos trilhos. Eram umas 10 ou uns 40, grandes e gordos. Eu que era caipira não sabia que eram aqueles bixos. Justo eu, que nasci no interior, mas mudei-me logo. Corri, corri, de tamancas velhas, pobre e magrela. Ainda hoje me sinto assim; desboiada. (Pablo Montevideu)

E eu estou indo a fundo, descendo a ladeira de pedras, descalço, esfolando os pés no chão duro e resistente. Vou escrevendo minhas lamentações, meus desassossegos - que chateação. Eu vivo as melancolias plenamente. Leitores ou fantamas, estou quase terminando meu livro - um monólogo chamado "Nada mais que a verdade". E desenfreado que sou, entre minhas revisões gramaticais perfeccionistas já escrevo outro monólogo - "Além de mim, ninguém". E megalomaniaco que sou, penso noutro livro/monólogo, que será chamado de "Perto do fim". E por finalmente, terminarei minha saga de monólogos infindáveis. Se publicar, não sei, poderão ler. Não há garantias, ser escritor é ser como uma pedra no caminho ou se tropeça ou fica ali até virar pó. E depois disso talvez eu me exile no templo budista de Cotia ou matarei-me finalmente.

Ilustração - Pablo Montevideu

quarta-feira, setembro 26, 2007

Estórias

Meus olhos nada véem, mas não sou cego. Minha espinha é uma continuação de meu cérebro, é tão pensante quanto meus neurônios, na verdade, eles se ramificaram por todo meu corpo. Assim, sou nervos à flor da pele, sou sensível por inteiro. No coração, bombeia sangue, bate, meço no pulso, quando consigo encontrar as batidas, nem sempre com sucesso. Meu corpo reflete, sim, reflete meu mundo, de coisas inadmiráveis, parece então que tudo é cinza, as pessoas que me falam, as mesmas que me véem. As palavras nada dizem, embora qualquer palavra diz coisas, ou coisa alguma. Eu vou durmir na esperança de morrer, sem temer ausências e não prazeres. Carregar o peso do contemporâneo é muito sofrível. Viajar sem passsagens pelo corpo é enriquecedor. E quem deseja um fardo assim. Minha espinha pensa, porque ela é meu cérebro, e meus ossos são continuações de neurônios. Sou todo assim, todo pensamento.

terça-feira, setembro 25, 2007

HP e MTV for a new notebook limited collection

Recado - Estou participando do concurso mundial "New Design" para uma série de notebooks da HP para 2008. Ao lado minha ilustração que já fazia parte de uma coleção de ilustrações que fiz meses atras.

domingo, setembro 23, 2007

resignado

Estou resignado, cansado, meu corpo não entristece nem se alegra além da conta. Não há sonhos ou desejos, quer dizer, pequenos fragmentos de vontades, nada demais, somente corriqueiros mandos e desmandos da rotina. Época estranha que vivo. Será o mal dos trinta anos ou o coisa de início de século??? Quem responde, quem concentra sabedoria suficiente para me responder? Duvido que há.

sexta-feira, setembro 21, 2007

Estórias

É um corpo ao chão. Pode estar morto ou não. Quem sabe está dormindo, mas de uma maneira tão serena, não se nota a respiração, é quase morto. As moscas já rodeiam, se ele ainda vive, não sente absolutamente nada, nem as minúsculas patas da mosca de padaria que circundava os sonhos. E as pessoas passam, passantes, notam algo no caminho, no caminho de todo dia, da rotina, um obstáculo, e como tal, ultrapassam, vencem o empecilho. É isto, tornou-se empecilho, nome dado a quem morre ou adormece morto na rua, no caminho, no rastro de cada jornada, do árduo e dignificante trabalho. As pessoas passam, pulam, vencem a coisa ao meio, ohhh "estapor" - grita alguém sem brios, sem classe. Calçam, eles, sapatos de couro brilhantes, sapatos de salto agulha ou tenis urbanos de pano multi-coloridos. Jeans, saias, meia-calças, calça comprida, curta, social, street, contemporaneo, passos apertados, esguios, rápidos, ríspidos, desengonçados, saltitantes, nossa, alguém consegue caminhar na vida saltitando; não se duvida da diversidade. (conto/roteiro, para micro curta, em fase de produção)

terça-feira, setembro 18, 2007

Muros sempre se quebram

E o muro que era de concreto,

intransponível, gélido e "burro"

partiu-se ruindo toda dor

em muitos pedaços estilhaços de lágrimas.






E só restam os entulhos.
Do que um dia foi um muro de concreto.





E quando sobra apenas escombros de nostalgias


e tão abaixo deles, não se pode respirar,

sufoca, sufocando, sufocante,

ninguém aparece,

nem o Resgate

é sinal da Morte

"lhe," "me," fazendo uma visita. (Maurício Filho)

sábado, setembro 15, 2007

Shouting...

É assim que estou e sou, faz quase dois anos.

Reconhecer-me, tem sido doloroso.

Ilustração de 2005 - "that year".
Estou cansado, do mundo "fogo de palha" que faz um estardalhaço e logo se transforma numa fumaçinha ridícula, enquanto meu mundo queima feito lava vulcânica incandescente a mil graus na sombra.
Estou letárgico, sem criações, artes, poemas, lirismos, nada além de uma vontade de deitar num canto e fechar os olhos, não abrí-los pra nada.


quarta-feira, agosto 29, 2007

in[San]os


"Ela amava o muro de concreto frio como se fosse o lençol mais quente e macio de um hotel luxuoso de Paris"

Minha In[San]idade mais bela e verdadeira.
Se a "morte-me" vier, nas asas dessa onda nostálgica fica registrado nos bytes desse mundo virtual um amor lírico, uma paixão sóbria (sem drogas), na dor do aprendizado;aprendemos e ensinamos, um ao outro, a arte de amar e de se apaixonar no escuro. E isso, o tempo não apaga, meus caros.

domingo, agosto 26, 2007

"All that days"


Todos aqueles dias. Um desabafo da madrugada, da insônia.

Quando Yumi faleceu, inesperadamente, não compreendia qual funcionalidade teria ela em minha vida. Parece-me as palavras que deixei de dizer ano atrás começam agora ressonar em minha mente, minha própria voz, com as respostas que eu mesmo ocultei. Pra me apagar os antigos fantasmas in[san]os, só mesmo ela, Yumi, e o destino, mesmo não crendo-lhe, me impossibilitou.

Aparentemente ela levou consigo, pro caixão, meus últimos sopros de vida. Que absurdo, isso é Beckett, absurdamente beckettiano. Na foto, outra vez, aquela que o tempo não me concedeu. Beleza instigante, justo pra mim, tão dono do obscuro e dos enigmas, por tantas vezes. Como queria, ter mais fotos dela. (fto-Teresa Yumi)

"That days"

Estou feito "That Days", de Beckett, por Gerald, para Julian Beck, escutando vozes do passado, como transmissões velhas de rádios, com aqueles chiados peculiares das antigas FM e AM´s, ressonando permanentemente evocações de minha vida, outras além, quem sabe, são alucinações esquizofrênicas. Poderia me pôr num palco, sentado num sofá, poltrona, melhor seria, ao lado uma mesinha arredondada, com tres livros capa dura e antigos, sobre os livros um cinzeiro vazio, de um não fumante, pura frescura, uma lata de aluminio de um refrigerante famoso e pop, marketing, ao fundo escuro, imagens vagariam, projetadas de um projetor, é óbvio, fantasmas, entre os ruídos das estações de rádio, no qual o locutor, é minha própria voz, do antes, brincando e dialogando com aquele estorvo, esquelético ali, sentado, quase se deitando na poltrona, irritado, enfastigado, angustiado, ora de pernas pro alto, com a cabeça quase tocando o chão, ora de lado, visivelmente, incomodado com a vida; pagariam ingresso, na bilheteria para vê-lo - não se preocupem, nem respondam, colocarei vossos nomes na lista de convidados.
Um Conto qualquer

segunda-feira, agosto 20, 2007

contos pra boi dormir

Meu nome é Alguma Coisa da Silva. Não estranhe, pois a mim é tudo que sou. Foi repentino que me descobri assim, o próprio mundo me fez de tal jeito. Eu nasci com nome próprio, registrado com certidão no tabelião, mas não me perguntaram se assim eu desejava, alias, nenhum pai ou mãe espera o filho aceitar sua graça, que lhe caberá por todo sempre. Mas meu problema não era um trivial desgosto pela alcunha de minha filiação, bem mais profundo, sempre busquei mais que os nomes, e sim, identidades, com os quais pudesse me recriar. Passei a assinalar-me de tantos trejeitos, personas, como pode, um personagem criando tantos outros, é insensatez, é complicar o evidente, de repente, nada faz real sentido, nada se alterou. Falar do vazio que dá, na solidão do presente é comum, o incomum é aceitar, que tantos nomes e sobrenomes não resolvam a questão. Meu nome é Alguma Coisa da Silva, até que o próximo causo se desenrole, ou vá se casar de véu e grinalda na Igreja Imaculada Icosagonal do Nada.

domingo, agosto 19, 2007



Não sei pra que fiz essa coisa aí. Uma ilustração que talvez, inconscientemente representa a atualidade; um nada, sem razão, de valores inexistentes, de carcaças falantes, um conjunto de cópias sobrepostas, colagens de outras colagens, conteúdo insípido, com fins lucrativos. Em todo caso, está aí.

Já não sei mais como me auto assinar, meus alter-egos já não me representam nada.

Assinado: alguma coisa

sexta-feira, agosto 17, 2007

contos pra boi dormir

Hoje passei lá, aonde meus sonhos estiveram presentes, coisa que não valorizei, sou ignorante, paciência, olhei por fora o prédio, imaginei por dentro, adentro, do apartamento, os móveis, o quarto, a mesinha da TV, o computador, a cozinha e o banheiro, de banhos quentes, quem sabe quem lá está, um novo casal, nova estória, filhos, um alguém outro, solitário, esse sou eu, desculpe, você não mais, esqueci de resgatá-la, você, quem dera, eu mesmo, trancou-me por dentro e levou as chaves - mulher ?

quarta-feira, agosto 15, 2007

Reis ou Rainha, todos são Mentira


Eu tenho Reis de mentira, outros Rainhas, Gerald teve uma avó de Mentira. The Queen Liar, com sotaque alemão, ou melhor sem sotaque, isso foi apenas efeito especial de teatro. E sobre mim, pesou-me alguma verdade oculta, eventualmente de plantão no espetáculo. Num dado momento, peões moveram-se no meu tabuleiro. No lugar do rei, havia meu rosto, com uma venda, me cegando para que eu caminhasse entre as trevas, com sombras grotescas e demônios sedutores, me acariciando, degustando carne viva - um horror. Era alguma culpa, auto proclamada, mas não era eu a vítima?! Havia um frio, não, isso era o ar condicionado em desajuste, reclame na saída, o frio era proposital do diretor espetáculo então, queria nos fazer sentir no inverno alemão dos campos de concentração, absurdo novamente, esse frio era sua mente presa ao passado. O que seu pai fez ou aquilo que não fez, deixou sozinho, um menino na gaiola, lembrou até do pássaro preto aprisionado, um dia tentou abrir a jaula, mas o pequeno corvo não saiu, prefiriu a solidão. Tanto que desprezou o amor da musa amada, outro fantasma, de olhos orientais que lhe tentou na cadeira H7, vaga pelo senhor que nos quinze do intervalo, pegou a senhora dele e escafedeu-se pra casa. É o pai, é a musa, é a sua mãe, tantos carcereiros esse menino carrega. E hoje, Ele, jovem adulto envelhecido na alma, por fora a pele é vitoriosa, caminha a sós, junto ao passaro preto da velha gaiola, dentro de outra ainda maior, no quintal quadrado da antiga casa, sobrado germinado ou de sua mente conjugada 2 quartos, sala, banheiro, cozinha copa. O qual ele paga a duras prestações, por mais cem anos com juros.


Conto [des]inspirado em alucinações a peça Rainha Mentira - de Gerald Thomas

domingo, agosto 12, 2007

Ano UM (despercebido) Um ano de Blog

Passou-me despercebido, era Julho de 2006 recomeçava minha saga. Não é somente um ano de blog, textos, estórias, resmungos e tentativas frustradas, mas um ano de um exílio necessário para a vida; a minha vida. Porque é na solidão que se mantém contato com o inconsciente, tão desprezado em nosso tempo pela humanidade, é na melancolia residente, o indivíduo pode tocar a si próprio, enxergar erros, defeitos, existenciais e ocasionais, para se possível evoluir.
A existência humana não deveria ficar à cargo apenas do consciente e cotidiano, como a maioria de transeuntes desse planeta o fazem. A vida é muito mais que o tão esperado fim de semana, compras no shopping, baladas e bebedeiras. Mas o que ficou, depois de tantos milênios de civilização é o que tem-se, as banalidades de seres humanos, carcaças desalmadas e superficiais. Eles, ao menos, são mais felizes, e sendo a vida um eterno jogo em busca da felicidade, o errado sou eu, sempre fora eu, um eterno desafeto da vida plena, um grande menestrel solitário do absurdo, um fracassado senhor de um castelo arruinado, de trevas e luz, formadores de belas figuras de natureza morta.
Sou isso, um equívoco da natureza, mas a vida também necessita dos descasos, portanto, justifico minha presença. Mas queridos fantasmas, ainda resguardo em mim momentos de fraternidade, para destilar ironias e sarcasmo. E dou graças, aos bons passeios no parque, em dias ensolarados na companhia de minha linda pastora alemã - Hanna, amor incondicional, e meus escritos desesnfreados.
Estou trabalhando em muitas coisas, literatura, cinema, artes visuais, não garanto absolutamente nada, quem sabe, algo apareça, seja concebido, enfim. Esse blog não é o primeiro que desenvolvo, já deve ser o terceiro, pois cada espaço criado por mim é um motivo para se desconstruir. Isso eu faço perfeitamente. Agradecido aos fantasmas que aqui entram eventualmente. Au revoir a tout le monde

Mini-conto

Saudades da Tevê ligada, do filme pela metade, da pizza quente esfriando, da cama desarrumada, da janela aberta, da noite fria, banho quente, na penumbra, das brincadeiras, conversas afiadas, mesmices delicadas, mãos dadas, do orvalho, da manhã, do bater da porta, fechar da fechadurada, chegada do elevador, silêncio, passos, ligar do motor, primeira marcha, saio, disparado,vazio.
contos para boi dormir

sexta-feira, agosto 10, 2007

Mini-conto

Cartas: sonhei contigo esses dias, por isso lhe pergunto se você ainda toca violão, pois no sonho você estava numa festa, numa mansão circundada por muitas piscinas, que adentravam dentro da sala, com móveis na cor branca, espelhos e vitrais, de onde entravam uma luz muito forte e cheio de paz. Muitos lírios em vasos e jardins em formato de grandes círculos e pequenos mosaicos, dentro e fora, como se o externo e o interno se misturassem. Haviam muitas pessoas, você estava lá tocando violão, foi tão estranho, de uma sensação difícil de explicar através de palavras. "Foi então, após ler sua carta, descobri que ia morrer."
contos para boi dormir

quarta-feira, agosto 08, 2007

Mini-conto

Varrendo-se, gasta-se o dia. Toda tarde, marco um tempo comigo, após o baixar do Sol, estou eu em meu quintal. Meu quintal é irregular, ao longos dos anos o chão áspero se desfez, o que faz acumular as folhas da árvore de sete copas, avermelhadas e grossas, que dá sombra mas nenhum fruto, meu pé de folha. Toda tarde, meu encontro é comigo e a vassoura, varrendo as folhas pra num amontoado depositar no saco de lixo preto pensamentos que resguardo e aguardo. Após, digo adeus ao senhor Outono, estará ele de prontidão pela manhã, amanhã, depois de amanhã, sabado, domingo, até seu fim. E minha vassoura descabelada, em pé, na espreita, enquanto ventos intrusos cobrirão meu quintal com as mais belas folhagens secas, meu quintal irregularmente sou eu.
Contos para Boi Dormir
Ao som de Ulver

terça-feira, agosto 07, 2007

Mini-conto

Televisão ligada para as paredes. Nestas, três quadros, uma paisagem pintada em óleo, comprada de um artista de rua, outro um retrato, um senhor do século 19 aristocrata, o terceiro completando a fileira, uma arte concreta e geométrica. A luz é baixa, o sofá de couro ou imitando, da sala um corredor para a cozinha, na mesma ainda, uma escada em mármore que leva aos aposentos. No centro da sala uma mesinha, uma taça com vinho pela metade, um livro de capa dura antigo e o telefone sem fio sobre. No sofá uma manta verde comprada em alguma feirinha beira-mar. No canto do sofá outra mesinha, a base do telefone, ao lado cadernos com anotações, acima disso, óculos para leitura empoeirado. A televisão ligada, som baixo, quase mudo. Tudo empoeirando-se. No outro canto a cortina busca formas de vida levada pela brisa. A sala, isso é tudo.
Contos para
boi dormir

segunda-feira, agosto 06, 2007

Mini-conto

A colação de grau era um dia a mais. Para o resto, era O Dia. Para um, nada além do que um dia depois de ontem, antecedendo o amanhã. Falta de ânimo, desencanto, desembaraço, calor de trinta graus em pleno inverno, aquela roupa preta, pesada, o chapéu de formando típico, tipicamente idiota, a gravata de seda na cor azul. Fotógrafos em linha reta, cada sala atravessada, uma pose, pedem para sorrir, estica a boca, franzindo os lábios, sorriso desconcertante. O ato final, finalmente, a entrada no salão, familiares e amigos, flashes de câmeras, felicidades, nem todos, mais um dia, antes da noite. Tomam-se os lugares respectivos, por ordem alfabética, agora é esperar ser chamado. Não é o OSCAR, mas bem que uns assim desejam. Senhor Amadeus Moreira Albuquerque Brandão Filho, ainda está no A, porque meu pai não me chamou de Abel, seria tão rápido, suor, calor, todos apertados, finalmente chegou, vai acabar. Nada vai fácil, o que foi difícil conseguir, novas paradas, fotografias, de canudo em mãos, aqueles beijinhos trocados do cerimonial, os para... como é que é aquele nome? E fim, o locutor, depois de horas grita os parabens aos formandos, todos se abraçam, nem todos. Onde está minha gravata, você viu uma gravata, escoregou por meu pescoço, terei de pagar 15 contos, ah me dê licença, preciso encontrar minha gravata, devolver essa beca, pegar meu cheque calsão e ir jantar.
Mini-conto
pra boi dormir

quinta-feira, julho 26, 2007

Fatos - férias da vida


Uma coisa tentadora, vislumbra-me, uma atitude, um egoísmo, um desencanto, um [des]sentido, um ato imoral, amoral, uma soberba, alguma coisa.
E pensar que tempo atrás estava eu renunciando, rompendo com alguém, para salvar ninguém. Não pude salvar a mim mesmo. Da razão só minha, das letargias, dela, sobrou-me, meu desassossego.
Salvei a quem mesmo?? Um brinde ao fracasso.

sábado, julho 21, 2007

No estories


Sem estórias por hora. Deixo esse resmungo de bom tamanho. Na foto, eu e minha doce gigante pastora alemã, tão complexa e complicada quanto o dono dela. Já disse, ela é a mulher da minha vida. E tenho preferido sua companhia. Há tempos que os humanos perderam a importância para mim, os humanos de carne e osso que tenho vivido por aí. Salvam-se autores da literatura, dramaturgos, pintores, gente que nunca conheci pessoalmente, somente através de livros, espetáculos, quadros, esculturas, ideologias.
O ser humano se tornou extremamente mal educado, e vejam só, um anti-social descobrindo isso. Mas nunca fui mal educado ou displicente. E num momento de tragédia, todos parecem ser "humanos", comovidos pela dor. Mas querem saber, isso é somente fachada. Desconfio eternamente. Ser bom ou emocional em grandes momentos de dor é muito fácil. Mas nas pequenices, nos instantes gerais da vida, imperceptíveis, ser "humano" tem sido bem raro. Essa é a grande diferença. Nem com todas as almas no céu, que se foram, poderá nos salvar.

quarta-feira, julho 18, 2007

Estórias

Sou pago e faço o trabalho. Acostumei-me a viver da mentira, transformando-a na verdade, sempre que assim pagarem-me o necessário. Mesmo diante da injustiça, o mal também tem seu lado e sua defesa. Muitas das vezes tenho a mim todos os fatos contrários, um juri observando-me, um alguém esperando algo fantástico, a salvação, o coelho da cartola.

Eles acalorados pela situação evidente, situação tal, faz com que todos permaneçam de um lado, julgam-me incapaz de sensibilizar. Mas que há de errado em ser o defensor do lado ´feio, do mal, do criminoso, do forjador, do algoz ou representante da dor. Alguém terá de ser.

Quando a sociedade, e o poder que a faz, assim pedem a condenação, meu trabalho é perdido. Os valores morais e a necessária punição vencem. Eu cumpro meu papel social, cabido a mim, quando ao lançar-me nessa jornada. Confesso as vezes, torço contra mim, por minha derrota, na verdade, outro de mim; temos tantos personagens vivos e sobrepostos, não é mesmo?!

Se eu perder, não é derrota completa, minha felicidade é inerente a vitória ou não. De qualquer forma eu recebo, ou pelo Estado ou pelo réu. De modo algum sou relapso, nem contra as maiores adversidades, sou do possível e impossível, vou até o fim. Enceno o máximo e busco nas brechas a pena mais justa, interpretando o livro negro de uma forma, vamos dizer, pouco ortodoxa.

Sou advogado, meu último cliente matou trinta e cinco pessoas, em série, depois picotou todas e as cozinhou, para jantá-las. Mas a lei exige um defensor. Ele não tinha chances, nem ao pedir clemência. E quer saber; mereceu a cadeira elétrica. Quem disse que preciso crer na inocência.
O advogado estória de
Pablo Montevideu

domingo, julho 08, 2007

Estórias - Retratos de Outrora

Tivera tido um amor, de que no durante, pouco se soube saber. Era amor desconhecido de um lado só. Tratava com causualidade destemida, as vezes por ignorância de si mesmo, desprezo despejava. É difícil até "redizer" sobre tal estória, acontecida, mas que nunca fora História de certo a um deles, somente na outra parecia resplandecer a felicidade.

Do jeito dele, foi-se indo, deu o que lhe conhecia desses sentimentos. Vai ver, não acreditava em coisas do coração; sujeito pensava, que era órgão de bombear sangue e o resto culpa era do cérebro, maquinário complexo no topo responsável por erros deles. O amor não era coração, era amor cerebral, do dele sim - do dela não. Pagou-se o preço

Mesmo na incoêrencia, foram-se, vivendo felizes, plenos. Uma coisa poética mesmo, dois corpos, tocavam-se em si, poesias parnasianas, simbólicas, modernas, concretas. A sensualidade deles, não estava apenas no carnal. Era o dom, da cumplicidade e intelectualidade discorrida madrugadas dentro, acalentados por uma brisa, sempre disposta a refrescá-los na noite quente.Sufientes.

Quando o frio pregava sua peça, eram os corpos, em extase, suficientes em si, lhes oferecendo calor, para outra noite a mais. Tudo terminava, quando ele deixava um tanto antes do Sol nascer por total. Nas janelas o orvalho dos deuses ou o hálito dos amantes, dúvida, indecifrável. A porta se batia, o elevador esperava atento, como fossem eles reis. Ela ainda em transe, andava semi nua, pisando em ovos, ressentida pela partida. Tudo era lindo, mas de repente, esfriava. Sentia frio, mas não queria agasalho, precisava demais, um abraço - insufientes.

De certo, sabia, de sua necessidade do sofrer. Deixar a realidade para lá e por uma vez na vida viver o lirismo dos livros amarelados, escritos em línguas de pronúncia delicada. Isso era um sonho, um despertar eterno. Ela se banhava nas águas da manhã, já pensando no próximo encontro com o mago, seu bruxo, seu crime, seu fim. E chorava, a felicidade, a dor, depois escrevia tudo em papel de carta, dobrava e colava um selo. Depositava na janela, esperando o bem-te-vi levasse a mensagem para longe, com intuito de oferecer para alguém distante um pouco de seu amor benevolente.

Ainda, não tarde, pendurava no varal seu, dela, retratos em preto e branco de seu amor maior. Ela amava com os rins, além do coração. Nesses fragmentos ao vento, trechos de poemas ilustrados. O vento dialogava junto a brisa da noite. Esta falava ao vento, o quanto amavam-se. O vento dizia, ele nem tanto. A brisa testemunha ocular, replicava zangada, e dizia, não traga chuva, vai borrar as fotografias. O vento indisciplinado, rancoroso e irado, ventava para ela, uma chuva forte.

Apagava assim cenas de um sonho, dentro do sonho, eterno. Essa chuva, derramava-se dos olhos dela, da amante, da amada, sabida ela, do fim. Hoje, uma é felicidade, outro é nostalgia.

na voz de Pablo Montevideu
Retratos de Outrora

quarta-feira, julho 04, 2007

Estórias

Isso foi pra bem de lá. Tudo aqui é duro, é concreto cinza, mas o concreto também curva-se pra lá e pra cá. E desses cantos, muitas vezes servem de moradia a uns excluídos ou por azar, ou falta de competência. Estranho esse pensar, não seria um destino e conclusão doutro? Deixo-me filosofar noutra oportunidade. Pois, o que deve ser contado, é aquilo que Zé Galopeiro não fizera.

Homem da rua, a rua é sua vida, não tem outra, desconhece novidades, mas pense bem, a vida nas calçadas e praças, dia e noite sem parar é demais por movimentada. Pode não ser sofisticado, mas marasmo não se tem. Essa é minha opinião, vai saber o que o Zé pensa. Mas quem conhece apenas uma realidade, não pensa noutra não. O Zé carrega consigo, uma carroça velha de madeira que vive emperrando em subida e desce a toda nas ladeiras, o que causa acidentes. Em sua traseira seus fiéis filhos, quatro vira-latas, cuidadosamente alimentados por ele. Nessa carroça carrega o lixo que não é lixo. Aquilo que lhe sustenta com o pouco, que a sociedade lhe dá. Ora, a quem a sociedade deve, senão à si própria. Mesmo nas adversidades, comida não falta aos vira-latas, nem que pra isso aperte-se a fome.

Em sua idas e vindas, dentre avenidas e alamedas, conheceu os cem Sóis, daqueles do meio dia às seis da tarde. Sujeito como ele, vindo do interior, ainda ao passar por qualquer igreja faz o nome do pai, do filho e do espírito santo. De tanto andar esqueceu a oração, mas pensa em Deus e pra ele é o que vale. São tantos anos, perdera a privacidade ao dormir em praças com os cães. Sente-se um tanto animalesco, irracional. Se bem pensar, olhar, analisar, as barbas grisalhas e compridas, o rosto preto queimado do Sol, o mal cheiro, as unhas gastas de raspar o asfalto quente e os pés cortados nas botinas velhas, dá um aspecto selvagem, como fizera o caminho inverso da evolução - Involução.

E nesse safari de savanas solitárias dentre os milhões, de outros além, invisíveis a sua jornada, Zé esquecera, que um dia fora humano, dono de rotina, família, mas que de agora por diante, tens única missão de alimentar os cães. O que ele não fizera, foi algo prometido ainda criança, de rezar uma missa, pra sua mãe morta, promessa ao santo - que o tempo esqueceu e a bebida salientou.

E na noite de quarta passada, dentre fogos de artifícios estourados num canto qualquer das esquelotasas torres verticais de concreto, alguém saudara a felicidade, Zé enterrava solenemente a morte de um de teus filhos, dele, aos 20 anos morto - era um mestiço de labrador. Clamou a natureza, ele Zé Galopeiro, o porquê dos cães viverem tão menos que gente.

Pablo Montevideu
Notas-Ainda tenho em mim a letargia que me assola por meses. Fazem meses que minha produção se restringe a esses textos sem fundamentos. Estou de quarentena - entre planos de ilustrações das estórias, um curta metragem e outros textos que escrevo (monólogos). Essa estória acima, também é um fragmento de outr curta, que bem gostaria de terminar, sobre os mendigos de rua e as relaçoes deles com os cães - "O melhor amigo do homem de rua". Agora, porque descrevo aqui minha insatisfação comigo mesmo, com esse desânimo imprudente, que me engessou - talvez porque infelizmente aprendi a trabalhar sobre pressão. Ainda não sei, ser meu próprio algoz.

sábado, junho 30, 2007

Lá fora chovem

"Lá fora chovem - as palavras ditas e suplicadas de um dia e de uma noite."

Era o que gritava o poeta de rua, homem barbado, grisalho, escuro, não de nascença, mas de queimado do Sol, por vivência das ruas, perambulador de estradas, curvas, o Sol do meio-dia, das quinze horas, do fim de tarde. Cada qual, cada Sol, tem seu valor e sua queimadura. Na face dele, as marcas desses anos todos.

O homem passa teus dias, assim, dessa forma, andarilhando frases arritmadas, sem nexo. Passa-lhe perto, uma senhora, saída da Igreja de crente, perguntando-lhe, quando fora última vez que rezou e depois convidando à adentrar o recinto para a missa. Barrado antes, que aceitasse, pelo segurança que dizia à ambos, só entraria se pagasse o ingresso.

A mulher nada percebeu, o quanto as ordens de seus missionários e pastores era discriminatória. Sua ingenuidade era absurda. Ela, de simpática, queria apenas aumentar o rebanho evangélico de sua Igreja. O segurança, deverás instruído, provavelmente, logo viu, que o homem era um sujeito de rua, sem nada na carteira, muito menos conta em banco. Vejam só, pra rezar nesses palcos de Cristo é preciso comprovar renda; disparates.

Ah, ia me esquecendo, o tal homem queimado de sol, barbado e grisalho. Olhem só, preciso mesmo dizer, ele é lógico que não aceitou o convite da senhora. Agradeceu, por gentileza, já não vista em tempos atuais, em cidades grandiosas como essa. Ele, apesar da insanidade aparente, do cheiro forte de bebida, percebera de verdade, a má intenção do segurança e daquela gente de estirpe pouco branda. Recomendou a senhora que tomasse conta de suas orações para não ser tapeada e disse que continuaria cantando versos pelas esquinas, aos passarinhos.

Pablo Montevideu

quinta-feira, junho 28, 2007

Fatos


Recentemente publiquei um comentário no blog do autor teatral Gerald Thomas, ele me escreveu de volta, com um texto baseado no que lhe disse, que depois ele mesmo publicou no site diretodaredacao.com. Não escrevi nada além do meu desassossego diário, das letargias e frustrações que tanto duelo visivelmente em meus textos e porque não, em meus olhos, aos que me convivem pessoalmente. As vezes acho que nem em fotos consigo encobrir a melancolia no meu olhar perturbado.



Não consigo mais, ou não tenho conseguido mais, me divertir nessa vida. Dizem que o trabalho perfeito é aquele que lhe faz rir. Já, nada, me faz rir, seja trabalho ou rotina da vida, família e etc. Até finjo. Esses meus talentos inatos de ator, de fingimento, encenação. Sou pura encenação, desde a alegria até tristeza. Que incoerência - até mesmo na melancolia.


No trabalho, não tenho feito nada. Incapacidade de concentração e desmotivação. Como disse ao Gerald, me enfiei numa tumba por tempos, para separar os vários de mim, entendê-los, depois conviver com eles, mas o que fiz foi apenas me sublimar, num só Estado, estado perdido, atormentado. Conviver com dramas éticos, desde a vivência nesse capitalismo desgraçado, busca da satisfação, do equilíbrio, das finanças, do consumismo da sociedade, da necessidade de se manter, pagar contas, ter, possuir, dar a cara à bater, se auto sujeitar ao mercado, corporações, leis, regras e padrões sociais.


Não pedi a Deus, que meigo, para nascer. Porque então tenho de viver a lógica do capitalismo, do crescimento baseado em números e porcentagens, do acúmulo de bens. Porque tenho de reagir até tocar a estabilidade econômica, ter um futuro sossegado.


Sou tudo que qualquer mãe não gostaria. As mães desejam que teus filhos escolham um caminho de tranquilidade. No Brasil isso significa - prestar um maldito concurso público, ganhar um belo salário até a morte, com privilégios, inclusive de não ser demitido quando a terceira idade chegar. Emprego vitalício.


Isso parece o que Platão dizia para justificar a existência da escravidão - que escravos eram necessários, pois, sem eles, os cidadãos, como ele, não teriam tempo para filosofar. Mães pensam, de uma certa maneira como Platão. A minha, a tua, vossas mães, pais, avós, bisavós, vizinhos, parceiros, líderes mundiais, e o próprio diabo dos infernos. O diabo é nosso pastor, tudo nos faltará e abundarás.


Continuo em crise, que nem fingindo se vai (deja vu)

sábado, junho 23, 2007

Desenfarte

Contam que o tal vivia imprimido numa letargia só. Quando perguntavam se bem estava, fingia que não escutava, não sabia definir o estado em si, de si mesmo. Letárgico andava pelas ruas de pedras, daquelas que balanceiam os carros, quase desapertando todos os parafusos existentes na engenhoca, de pés descalços, ladeiras abaixo e acima, queimado de Sol, o mesmo responsável pelas rugas, que, como, um punhado de rios secados, de Marte, ou emaranhado de raízes percorriam os cantos de sua face.

Sujeitinho em desassossego, se esvaziava aos poucos, parecia vomitar palavra por palavra toda enfermidade do mundo, de todas as Eras do homem sapiens, pouco a pouco. A dimensão disso tudo é contrastante. Feito o homem da padaria, que morrera, de infarto, carregado durante anos de tensão, com os filhos problemáticos, mas altas taxas de gordura e nicotina, entupiu-lhe as veias e um belo dia, digo, mal dia, bateu com a caçuleta. A viúva tratou logo de se agregar com entregador de pizzas, dez anos mais jovem e fugida zarpou na vida. Ah, o homem de qual falava, esse é o contrário de um tudo.

Enquanto uns morrem enfastigados, este traste, prestes vai a morrer de vazio. Já não tem mais ar que o comprima, estado de graças, flutua feito astronauta perdido, parece um zanzazão maluco, gravidade nenhuma prende-o em terra. Mas quem enganas - a mim não. A mim teus olhos não são opacos.

De tanto vazio, tem alguma razão de haver. Seja pela decepção com o viver, pela ignorância das pessoas perante-o, sejam por infelicidades quaisquer. De modo faz todos pensarem, nesse tal de infarto, é culpa do mal hábito ou do mal vivido?

E doi forte no braço, dor sobe pro coração, diz quem sobrevive, nunca sabe ao certo, se sai do coração e cai nas pernas - fulminante. É dessa moléstia, uns passam pelo tal coma. Já vi em filme, sujeito entre a vida e a morte, num corredor de luz, algo puxando pra beira de lá mortos - enquanto doutores repuxam o vitimado à base de eletro-choques no peito. O "des-morto" vai que num vai, feito elástico, mas o céu pode menos que a UTI? Não sabe-se, não mesmo.

É fato, de novo, o esvaziado de vida, andava por cima duma ladeirona de pedras, quando sentiu a "não dor", coisa esquisita. Sentia o que ninguém sente, uma "desdor" danada. Caiu rolando pedras abaixo. Morto.

Levado para examinar, abriram nele do peito abaixo um corte, foi que por surpresa de toda medicina, nada havia. O homem estava seco por dentro, nem sangue, nem órgãos, nem veias, nem nada; nada mesmo, nem sonhos.

Era um escuro só.

Pablo Montevideu

quarta-feira, junho 20, 2007

Estórias - Ato Final

(continuação do Ato Um - abaixo)

_Havia dois homens nessa cela, estiveram presos aí por anos, foram-lhe dados a permissão para voltar ao convívio da sociedade.
_eles morreram ontem.
_como aconteceu?
_Pneumonia senhor.
_ não foram tratados?
_foi a friagem do concreto.
_eram perigosos?
_nunca deram um grito sequer em tantos anos.
_Pra quê então uma cela de concreto fria e cinzenta?
_Não sei, coisa lá de cima.
_Se não representavam perigo e jamais deram algum motivo pra tanto...Não consigo entender tamanha injustiça. Esse lugar não cuida de seus doentes, não lhes deram remédios?
_Não pediram.
_E se pedissem, dariam?
_Hum, não.
_E porque não?
_são loucos.
_E sendo loucos devem morrer?
_Sim senhor.
_Quem disse?
_Eles lá de cima.
_Ouviu alguém falando?
_Todos aqui falam.
_Porque acha que eles não gritaram ou pediriam ajuda?
_Porque saberiam que não seriam ajudados.
_sendo assim?
_sendo...
_diga você rapaz
_sendo assim, não eram loucos
_Ah, descobriu - eureca
_ O que é eureca?
_cale-se. Agora entende?
_ainda não.
_Ou finge-se de tolo.
_Eles eram tolos - não gritaram.
_Mas não seriam ajudados por ti.
_Não mesmo.
_ E porquê.
_Não gostava deles.
_Porque, diga-me.
_eram loucos.
_acabou de falar o contrário.
_Como?
_ que não eram loucos.
_É, eu falei. Mas se estavam aqui, nesse hospital, eram loucos sim.
_Você também está, nem por isso é louco, ou estou errado.
_Não - eu tenho consciência das coisas.
_e eles não o tinham.
_será?
_quer descobrir?
_tudo bem.
_Porque não gritaram por ajuda médica?
_Porque não seriam ajudados.
_E eles sabiam, alguém lhes avisou?
_não, deduziram.
_uma dedução é coisa de alguém sem consciência?
_não
_O que me diz?
_O senhor vai me prender?
_poderia
_O senhor vai me crucificar? Vai me algemar? Vai me deixar padecendo numa cela como esta, na qual, esses dois pobres coitados, injustiçados por anos, na escuridão, no frio, na solidão, abstraíndo-se do mundo real, buscando vida, no lugar algum, mas mantendo ainda, mesmo que por sofrimento, a consciência de que eram resultado da discriminação da sociedade.
_O senhor entendeu tudo. Meu trabalho está feito.
_E eles lá em cima. Não terão uma lição?
_Eles - jamais existiram.

Pablo Montevideu

segunda-feira, junho 18, 2007

Estórias - Ato um

Dois homens, numa sala rústica, de puro cimento, frio, sem acabamento, iluminados de dia por uma janeleta, quando o Sol surge, e a noite, quando a Lua renasce, dois homens em trajes brancos, parecem fantasmas conversam, entre si:

_ Não lembro mais meu nome...
_ É, eu lembro
_ Pode me dizer então?
_ Pra quê quer saber?
_ Ajudaria entender essa situação.
_ A nossa, é nenhuma.
_ Nenhuma, mas vivemos.
_ É Tomé.
_ O que?
_ Tomé, seu nome.
_ claro...que não - se fosse Tomé lembraria certamente. Não me sinto um Tomé.
_Pois, sinta-se, é um Tomé. E eu sou Pedro.
_nomes bíblicos - porque nos foram dados nomes assim, somos desgraçados por isso.
_ Ele te chamou de Tomé.
_ Ele quem? Fale coisa com coisa.
_ O homem que nos trancou, vestido de branco.
_ Também estamos vestidos de branco, talvez, nós mesmos nos trancamos aqui.
_Como sabe que isso é branco. Isso é uma imundice. A luz foge daqui, vivemos nas trevas.
_ Mas eles nos dão comida.
_ Agora então você acredita.
_ Em que?
_Neles, você acabou de falar.
_ Falei, mas foi súbito, entende.
_ Não. O prato passa por baixo da porta, como prisioneiros. E vem sempre a mesma comida de porcos, odeio.
_ Porque você é assim, tão ríspido.
_Alguém aqui precisa se manifestar.
_ Para as paredes?
_ Não seja ironico comigo, ou te dou um pontapé na cara.
_ Faria isso comigo, seu unico amigo, ouvinte, nas trevas.
_Não, acho que não, mas é que você me irrita com sua conformidade.
_Somos imutáveis, Tomé.
_Pedro.
_ O que foi?
_ Não idiota, Pedro sou eu.
_ Eu sei, ja me disse.
_ Você bagunça tudo, até o que é evidente.
_Me diga - de que adianta nomes, se nas trevas somos nada. Só temos a nós mesmos.
_ Não foi tu mesmo que disse a pouco que talvez ajudaria.
_ Tomé, Tomé.
_Sou PEDRO, já disse, seu asno.
_ calma, falo comigo, não consigo.
_ você é um maluco.
_ De fato, por isso nos prendem.
_ Ta vendo, você acredita neles.
_ Sempre há mais alguém. O mundo é grande.
_ Como sabe, estamos aqui por Eras.
_você contou o tempo?
_ pelo tamanho de nossos cabelos, barba, pelas dores nos dentes, pelas estações do ano, pelas goteiras das paredes cinzentas e gélidas, pela quantidade de resfriados que pegamos nesse iceberg de concreto, pelos arranhões no chão, pelos gritos e uivos desesperosos, pelo choro de impotência...
_Pare...
_Porque, tem medo de saber a verdade, preferes teu mundo imaginário?
_Sim, é muito melhor.
_ você bem sabe, que é tudo falso. E você chora toda madrugada, por que não podes matar-se.
_Não?
_Quem é você, e eu?
_ Estamos confusos, repetitivos, vivendo personagens
_Ou falamos com nossas sombras.
_Sombras na escuridão.
_Sinal de luz, amigo, até mesmo aqui, a luz penetra.
_E porque não nos salva?
_Não merecemos?
_E merecemos isso.
_Não me respondeu, teu sonhador bastardo.
_ O que amigo?
_Porque não "te matas, a ti mesmo?"
_Como deixaria ti, sozinho nesse inferno.
_Então você tem consciência?
_Sim, eles que não.

Pablo Montevideu

domingo, junho 10, 2007

estórias

Dias desses aí, andando, pra onde sei lá quem sabe, uma conversa de dois homens me chamou a atenção. Parei e perguntei - é história ou estória essa dos senhores? Me olharam com sombrancelhas arqueadas, daquelas que só se vê assim em novela ou filme. Uma voz de lá dentro, falou - entre pra beber uma cerveja. Era um buteco, meio escuro, de bairro, vendaria de doces açucarados e cervejas para os homens gado. Entrei sim - não, me veja um suco de maracuja, estou um tanto nervoso hoje. O suco estava péssimo, feito de saquinho, sabe né, me encostei no balcão para continuar ouvir o que chamara minha atenção.

Dois homens na porta falavam sim, na verdade, o mais baixo, gordinho de bigode contava um causo, de alguém outro alguém. Um ninguém qualquer, parecia desconhecido ao gordinho de bigode, dado seu grau de intimidade ao contar a tal coisa ao outro homem - mais alto, de boné e sujo de tinta - pintor de paredes certamente.

O baixinho de bigode parecia cantar e não contar - melodiava feito repente, a tal estória -

Era homem só, de qualquer lugar
desses que se vê por cá e Lá
tinha mulher e filhos
tidos na época certa
menina moça esperta,
menino forte a beça
Deu de querer ser escritor,
passou a ler toda biblioteca,
no quarto ficava trancado
escrever, ler, escrever sem parar
acabou emudecido. Ora só
você que não me creia, mas o homem
esqueceu de falar, por um bom tanto tempo,
que de tal desatento
mudo passou, a ser sua condição.

Aí então, ralhei com eles, ali dois homens fechados em conversa, falando de alguém desconhecido, como se fosse conversa séria. O de bigode me olhou feio, como se falasse, não falou, pensou, talvez, na verdade eu imagino isso- acabou de chegar e já se intrometendo. Queria saber, porque alguém que lê e escreve, fica assim mudo do nada. O homem mais alto de boné abriu a boca grande, sem dentes - isso é pergunta?

Então desatei a dizer - já fui escritor de versos, leitor de poemas, e posso muito bem falar, vejam só, estou falando sim. E é claro, que o que fiz, foi apenas lhe perguntar. Assim, os dois homens com jeito de desentendidos me disseram: meu amigo, bendito seja teu suco de maracujá, pois, está a precisar. Mas o que conto é só uma estória.

Pois, era isso, de início, que perguntei, se era estória - e me olharam um tanto assustados. O de boné retrucou - sabe o que é isso, é nervoso de cidade grande, é muito cimento e concreto. O de bigode, apaziguou, dizendo - sou um contador de causos. Mas, mais vejam, eles se indagaram a mim - o senhor disse aí, dentre tantas faladeiras, que é escritor, leitor, mas e então.

E então, no dia que recuperei a voz, da rouquidão de alma doente, saí para pagar. E pagar o que??? - outro gritou de dentro do bar. Pagar a promessa que fizera.

Pablo Montevideu