Dois homens na porta falavam sim, na verdade, o mais baixo, gordinho de bigode contava um causo, de alguém outro alguém. Um ninguém qualquer, parecia desconhecido ao gordinho de bigode, dado seu grau de intimidade ao contar a tal coisa ao outro homem - mais alto, de boné e sujo de tinta - pintor de paredes certamente.
O baixinho de bigode parecia cantar e não contar - melodiava feito repente, a tal estória -
Era homem só, de qualquer lugar
desses que se vê por cá e Lá
tinha mulher e filhos
tidos na época certa
menina moça esperta,
menino forte a beça
Deu de querer ser escritor,
passou a ler toda biblioteca,
no quarto ficava trancado
escrever, ler, escrever sem parar
acabou emudecido. Ora só
você que não me creia, mas o homem
esqueceu de falar, por um bom tanto tempo,
que de tal desatento
mudo passou, a ser sua condição.
Aí então, ralhei com eles, ali dois homens fechados em conversa, falando de alguém desconhecido, como se fosse conversa séria. O de bigode me olhou feio, como se falasse, não falou, pensou, talvez, na verdade eu imagino isso- acabou de chegar e já se intrometendo. Queria saber, porque alguém que lê e escreve, fica assim mudo do nada. O homem mais alto de boné abriu a boca grande, sem dentes - isso é pergunta?
Então desatei a dizer - já fui escritor de versos, leitor de poemas, e posso muito bem falar, vejam só, estou falando sim. E é claro, que o que fiz, foi apenas lhe perguntar. Assim, os dois homens com jeito de desentendidos me disseram: meu amigo, bendito seja teu suco de maracujá, pois, está a precisar. Mas o que conto é só uma estória.
Pois, era isso, de início, que perguntei, se era estória - e me olharam um tanto assustados. O de boné retrucou - sabe o que é isso, é nervoso de cidade grande, é muito cimento e concreto. O de bigode, apaziguou, dizendo - sou um contador de causos. Mas, mais vejam, eles se indagaram a mim - o senhor disse aí, dentre tantas faladeiras, que é escritor, leitor, mas e então.
E então, no dia que recuperei a voz, da rouquidão de alma doente, saí para pagar. E pagar o que??? - outro gritou de dentro do bar. Pagar a promessa que fizera.
Pablo Montevideu
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