quarta-feira, julho 18, 2007

Estórias

Sou pago e faço o trabalho. Acostumei-me a viver da mentira, transformando-a na verdade, sempre que assim pagarem-me o necessário. Mesmo diante da injustiça, o mal também tem seu lado e sua defesa. Muitas das vezes tenho a mim todos os fatos contrários, um juri observando-me, um alguém esperando algo fantástico, a salvação, o coelho da cartola.

Eles acalorados pela situação evidente, situação tal, faz com que todos permaneçam de um lado, julgam-me incapaz de sensibilizar. Mas que há de errado em ser o defensor do lado ´feio, do mal, do criminoso, do forjador, do algoz ou representante da dor. Alguém terá de ser.

Quando a sociedade, e o poder que a faz, assim pedem a condenação, meu trabalho é perdido. Os valores morais e a necessária punição vencem. Eu cumpro meu papel social, cabido a mim, quando ao lançar-me nessa jornada. Confesso as vezes, torço contra mim, por minha derrota, na verdade, outro de mim; temos tantos personagens vivos e sobrepostos, não é mesmo?!

Se eu perder, não é derrota completa, minha felicidade é inerente a vitória ou não. De qualquer forma eu recebo, ou pelo Estado ou pelo réu. De modo algum sou relapso, nem contra as maiores adversidades, sou do possível e impossível, vou até o fim. Enceno o máximo e busco nas brechas a pena mais justa, interpretando o livro negro de uma forma, vamos dizer, pouco ortodoxa.

Sou advogado, meu último cliente matou trinta e cinco pessoas, em série, depois picotou todas e as cozinhou, para jantá-las. Mas a lei exige um defensor. Ele não tinha chances, nem ao pedir clemência. E quer saber; mereceu a cadeira elétrica. Quem disse que preciso crer na inocência.
O advogado estória de
Pablo Montevideu

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