sábado, junho 30, 2007

Lá fora chovem

"Lá fora chovem - as palavras ditas e suplicadas de um dia e de uma noite."

Era o que gritava o poeta de rua, homem barbado, grisalho, escuro, não de nascença, mas de queimado do Sol, por vivência das ruas, perambulador de estradas, curvas, o Sol do meio-dia, das quinze horas, do fim de tarde. Cada qual, cada Sol, tem seu valor e sua queimadura. Na face dele, as marcas desses anos todos.

O homem passa teus dias, assim, dessa forma, andarilhando frases arritmadas, sem nexo. Passa-lhe perto, uma senhora, saída da Igreja de crente, perguntando-lhe, quando fora última vez que rezou e depois convidando à adentrar o recinto para a missa. Barrado antes, que aceitasse, pelo segurança que dizia à ambos, só entraria se pagasse o ingresso.

A mulher nada percebeu, o quanto as ordens de seus missionários e pastores era discriminatória. Sua ingenuidade era absurda. Ela, de simpática, queria apenas aumentar o rebanho evangélico de sua Igreja. O segurança, deverás instruído, provavelmente, logo viu, que o homem era um sujeito de rua, sem nada na carteira, muito menos conta em banco. Vejam só, pra rezar nesses palcos de Cristo é preciso comprovar renda; disparates.

Ah, ia me esquecendo, o tal homem queimado de sol, barbado e grisalho. Olhem só, preciso mesmo dizer, ele é lógico que não aceitou o convite da senhora. Agradeceu, por gentileza, já não vista em tempos atuais, em cidades grandiosas como essa. Ele, apesar da insanidade aparente, do cheiro forte de bebida, percebera de verdade, a má intenção do segurança e daquela gente de estirpe pouco branda. Recomendou a senhora que tomasse conta de suas orações para não ser tapeada e disse que continuaria cantando versos pelas esquinas, aos passarinhos.

Pablo Montevideu

Nenhum comentário: