domingo, março 16, 2008




Lá vem o outono. A paisagem ficará acinzentada, dia após dia, mas minha alma já é daltônica e meus olhos enxergam vários tons de cinza. Um processo diário, entre a solidão e a existência.

Estou como essa imagem delicada e enfastigante - a pietà de Marina Abramovic, carregando um cansaço exaustivo no colo, nos braços, na mente. Uma exaustão duplicada e redundante como na frase anterior. Uma fadiga que nem oito horas de sonos diários, vitaminas e um Viagra possam resolver.

A fadiga da vida, do existir, do passado, presente, do inevitável pensar, a dúvida, o descabido duelar de forças, destino - escolha. O resumo de tudo é sobre essa desistência, essa [des]importância que dou as coisas mundanas. Quando digo - mundano, falo dos ícones da vida cotidiana, das mais banais, mas que todos, assim vejo, lutam diariamente, desde se plantar maravilhado frente a uma vitrine de loja com liquidações, bugigangas eletrônicas, automóveis de última geração. Nada disso me atrai, no máximo um desvio estrábico do olhar.

Minha vida tem sido assim e as palavras chaves são: desistência, descaso, desânimo e estrabismo. Estou-me afastando da vida cada vez mais, a passos desengonçados. Refugio minhas últimas esperanças em alguns trabalhos que faço, textos, contos, o último vídeo curta que desenvolvi, mas que não me deixou nada satisfeito, trabalhos futuros, ou não, nada logisticamente, nada substancial ou tangível. Estive hoje lendo desabafo de Gerald, e as vezes o desassossego dele é muito parecido com o meu, ao menos em suas palavras. Vai ver é mal de artistas.

E custo a me classificar como um Artista. Sei, que tenho os certificados pra isso, afinal estudei tanto, desde duas faculdades, cursos técnicos, especializações, oficinas de arte, vídeo, roteiro, livros de cores, softwares, literatura, teatro, workshops, enfim, tenho a qualificação e os dedos sujos de nanquim, grafite, cola, tesoura, papel crepom, carvão, óleo, spray, photoshop, isopor e o escambal. Tenho o direito de falar de boca cheia - sou ARTISTA. Ainda mais hoje nesse mundo de arte virtual, de artistas altistas anônimos que surgem dando pitacos na Arte, nos processos - com reconhecimento ou não - eu posso.

E segundo uma antiga professora, minha amiga, meus dias e noites de melancolia são provas suficientes, até maiores do que qualquer certificado ou diploma; pois eles atestam minha sensível visão da arte, do humano, e a junção de ambos. Então, chego a concluir, não se pode atingir a felicidade e a excelência ao mesmo tempo. A arte depende da dor e do tormento. Neste caso, sou PHD devidamente em dia com minhas cotas de fantasmas, alucinações.

Nesse blog dos meses de Abril a Novembro de 2007, tem uma série de contos e mini-contos, escritos por mim através de estudos de linguagens específicas do metafísico e da filosofia. São contos que depois de um tempo, ganham outros significados. O retorno de alguns leitores sempre ficou ou pela imprecisão de entendimento ou pela dimensão subjetiva que causa. O certo é que consegui por mim mesmo construir minha linguagem. Isso é bom, é só meu, ninguém mais deve ter isso, mas também fico preso aos meus próprios estigmas.

Bom, quem quiser ler, acessem - e agradeço aos que pedem que eu publique. Fico contente quando alguém compreende, sob formas pessoais, o que eu escrevo. Mas as editoras buscam novos "Harry Potter" assim como as produtoras buscam outros "Tropas de Elite e Cidade de Deus". Ninguém quer livros pensantes demais, ou filmes essencialmente introspectivos. Querem mesmo é tiros, sangues e uma dose de social.

Talvez pela culpa da desgraça humana que nos tornamos - os meios de comunicação então procuram levar pra Arte o descaso da sociedade e nossas parcelas pela culpa da miséria e podridão dos homens e das mulheres. A chamada Lei da compensação.


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